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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

ANÁLISE DO GÊNERO CRÔNICA

UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ –UVA

CENTRO DE LETRAS E ARTES - CLA
CURSO DE LETRAS
PRODUÇÃO DE TEXTO

ANÁLISE DO GÊNERO CRÔNICA

BASTOS, Nayanna Mesquita
SILVA, Antonia Morgana da
SILVA, Francisca Ângela de Sousa


RESUMO: O presente artigo trata-se do gênero textual crônica. Este gênero narrativo oscila entre a realidade e a imaginação, pois se trata de um relato poético do real, situado na fronteira entre a informação da atualidade e a narração literária. Crônica é debruçar-se sobre um fato, uma época e uma leitura subjetiva de mundo exteriorizada por um autor que ‘fala’ com intimidade e liberdade ao seu leitor, pois redigir uma crônica é ter direito a elaborar um texto livre onde a notícia não seja um produto industrializado, imparcial, objetivo, meramente comercial e descomprometido com interpretações, posicionamentos e opiniões . A crônica é uma somatória de pesquisa, seleção e inspiração e deve escolher um fato capaz de reunir em si mesmo o disperso conteúdo humano, pois só assim ela poderá cumprir o seguinte princípio: informar, ensinar e comover. Através desta pesquisa abordamos as origens do gênero, suas características inerentes na visão de teóricos e dos próprios cronistas, e as semelhanças entre este e o conto.
Palavras-chave: Crônica. Gênero textual. Conto. Linguagem
INTRODUÇÃO

Ao lermos uma crônica, envolvemo-nos, pelo prazer da leitura e proximidade com o gênero, o que nos permite ampliar nosso universo de conhecimento, pois somos instigados à interpretação, e, assim, avançamos como leitores: ultrapassamos a linearidade e, com isso, permitimo-nos atuar como leitores críticos. Tal enfoque de leitura permite ao leitor trilhar caminhos cujo contexto se compreende de diversas formas, seja pela sintaxe, pela semântica, pela estilística e pela retórica, seja pelo gênero crônica, definido entre a argumentação e a narração sobre fatos do cotidiano e um pouco mais.

No que se refere à linguagem, ressaltamos para dois fatores: um, de que a crônica, ao ser escrita sempre em primeira pessoa, desencadeia um diálogo, ou seja, uma conversa imaginária entre autor e leitor; outro, de que a crônica, escrita num estilo que oscila entre o formal e o informal, marca-se por construções não aprimoradas, o que a torna mais próxima da vida real.

A crônica moderna surgiu, no século XIX, quando a imprensa escrita atinge ampla difusão. Inicialmente, a crônica tinha a função de comentar, refletir num tom dissertativo, sobre questões políticas, econômicas, sociais, culturais.

Aos poucos, as crônicas deixaram de ter a intenção primeira de comentar e de informar e passaram a assumir uma caráter mais descomprometido, cada vez mais leve e com toques humorísticos. Os textos foram deixando de lado a preocupação argumentativa, opinativa e passaram a se aproximar mais da subjetividade e do lirismo da poesia.

Esse gênero procura humanizar o mundo, procura dar sentido à realidade aparentemente caótica, resgatando a singularidade do sujeito num mundo em que as pessoas parecem peças de uma grande máquina. Procura a grandeza dos pequenos gestos despercebidos. Como afirma Antonio Candido, “a crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a dimensão das coisas e das pessoas.”

Suas principais caracteristicas são:

Ligada à vida cotidiana;
 Narrativa informal, familiar, intimista;
 Uso da oralidade na escrita: linguagem coloquial;
 Sensibilidade no contato com a realidade;
Síntese;
Uso do fato como meio ou pretexto para o artista exercer seu estilo e criatividade;
Dose de lirismo;
Natureza ensaística;
Leveza;
Diz coisas sérias por meio de uma aparente conversa fiada;
Uso do humor;
Brevidade;
É um fato moderno: está sujeita à rápida transformação e à fugacidade da vida moderna.
Através desse trabalho, buscamos enfatizar os potenciais deste gênero textual opinativo, suas características , peculiaridades e familiaridade com os diversos generos existentes e em específico ao gênero conto.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Nem sempre é tão fácil definir e classificar os gêneros textuais. Há estudiosos que partem do domínio discursivo, outros que manifestam suas análises apoiando-se para segmentações tipológicas, e, existem ainda alguns que se aproximam do conceito de texto e suas variações. O domínio discursivo diz respeito a natureza da linguagem, esfera discursiva (gênero literário, gênero jornalístico, gênero acadêmico etc.).

As tipologias costumam agrupar os gêneros, dependendo da abordagem escolhido pelo teórico, a narrativa incluiria os gêneros: conto, crônica, poema épico, romance, história cotidiana, lendas, fábulas, mitos, novelas etc.

Os que entendem o gênero como um texto base e suas variações, avaliam a “crônica” por exemplo como um gênero e os subgêneros (crônica narrativa, crônica metafísica, crônica poema-em-prosa, crônica-comentário e crônica-informação) como variáveis de uma mesma categoria.

O conceito de gênero não é uma definição recente, desde os retóricos e os estudiosos da literatura antiga ou clássica já se apresentavam, de forma diversa do que é hoje, as concepções de gêneros.

Conforme justifica Marcuschi (2009, p.147): “O estudo dos gêneros textuais não é novo e, no ocidente já tem pelo menos vinte e cinco séculos, se considerarmos que sua observação sistemática iniciou-se em platão”.

Durante muito tempo, os gêneros foram estudados numa perspectiva dos gêneros literários. No passado, o discurso oral ou escrito era estudado também numa concepção retórica. Nesta percepção, consideravam os elementos da comunicação como indispensáveis para a realização do gênero, que eram “ter o que dizer”, “ter alguém interessado na mensagem” e “saber lidar com o modo de dizer”. Não se usava a palavra gênero, na retórica, mas discurso escrito ou oral, ou ainda, discurso religioso, político e etc.

A crônica se afastou da História com o avanço da imprensa e do jornal. Tornou-se "Folhetim". O folhetim fazia parte da estrutura dos jornais, era informativa e crítica. Aos poucos foi se afastando e se constituindo como gênero literário: a linguagem se tornou mais leve, mas com uma elaboração interna complexa, carregando a força da poesia e do humor.

Ainda hoje há a relação da crônica e o jornalismo. Os jornais ainda publicam crônicas diariamente, mas seu aspecto literário já é indiscutível. No Brasil, a crônica se consolidou por volta de 1930 e atualmente vem adquirindo uma importância maior em nossa literatura graças aos excelentes escritores que resolveram se dedicar exclusivamente a ela, como Rubem Braga e Luís Fernando Veríssimo, além dos grandes autores brasileiros, como Machado de Assis, José de Alencar e Carlos Drummond de Andrade, que também resolveram dedicar seus talentos a esse gênero. Tudo isso fez com que a crônica se desenvolvesse no Brasil de forma extremamente significativa.
DEFINIÇÃO E ORIGEM DO GÊNERO CRÔNICA

A palavra "Crônica" - do Grego, Krónos - mudou de significado ao longo dos séculos. A princípio, designava um relato cronológico dos fatos, isto é, relação ou narração de acontecimentos (episódios) históricos organizados conforme a sequencia linear do tempo. Em termos práticos, a crônica se limitava a registrar os eventos, sem aprofundar-lhes as causas ou dar-lhes qualquer interpretação.

Dentro dessa característica a crônica atingiu seu ápice após o século XII. Porém, nessa altura, a crônica já começava a apresentar uma distinção: as que narravam acontecimentos com a intenção de esclarecer ou interpretar, individualmente, os acontecimentos, mantinham o tradicional nome de crônica. Em contrapartida, as "crônicas breves", isto é, as simples e impessoais notações dos acontecimentos históricos, passaram a denominar-se "cronicões". A partir do século XIX, com o avanço da imprensa e do jornal, a crônica passa a ostentar personalidade literária, mas cursou um longo caminho até se firmar como gênero literário, ainda que dado como um “gênero menor”, como observa Antonio Candido.
A ‘crônica’ não é um ‘gênero maior’. Não se imagina uma literatura feita de grandes cronistas, que lhe dessem o brilho universal dos grandes romancistas, dramaturgos e poetas. Nem se pensaria em atribuir o Prêmio Nobel a um cronista, por melhor que fosse. Portanto, parece mesmo que a crônica é um gênero menor. “Graças a Deus”, —seria o caso de dizer, porque sendo assim ela fica perto de nós. (CANDIDO, 1981, p. 5).
Assim, a crônica assume o papel de registro da realidade social das comunidades humanas e registra os fatos reais ao longo de sua evolução no tempo. Ela como já se viu, firma-se como espaço heterogêneo em que convivem, por exemplo, o pequeno ensaio, o conto ou o poema em prosa. Sua identidade resulta também dessa diferença.

A caracterização da crônica como espaço heterogêneo pode ser vista, então, como decorrente da variedade de tipos em que pode ser escrita: poema-em-prosa, que apresenta conteúdo lírico; comentário, no qual se apreciam os acontecimentos, acumulando assuntos diferentes; crônica metafísica, que promove reflexões de conteúdo filosófico; crônica narrativa, que tem por eixo uma história ou episódio; crônica-informação, que divulga fatos, tecendo sobre eles comentários ligeiros.

Esta combinação de gêneros é uma das características primordiais da crônica brasileira. Contudo, a escrita da crônica no Brasil não se resume a este aspecto. Ela possui uma longa história e esta história apresenta personagens considerados fundamentais no contexto da literatura brasileira.
UM RÁPIDO CONFRONTO ENTRE CRÔNICA E CONTO

Qual a relação entre crônica e conto? Muitas vezes a crônica confunde-se com o conto, mas não é qualquer crônica que se assemelha ao conto. Quando a crônica recebe um tratamento literário em relação ao texto jornalístico, como o uso de várias figuras de linguagem, quando um pequeno enredo é desenvolvido, principalmente com diálogo; é que ela traça fronteiras muito próximas do conto. Tão próxima, que muitas vezes, é difícil estabelecer uma linha divisória. No entanto, podemos enumerar algumas características da crônica que podem ser confrontadas com as do conto.

• Personagens: enquanto o contista mergulha de ponta-cabeça na construção da personagem, o cronista age de maneira mais solta.

• Narrador:Enquanto no conto o narrador (protagonista ou observador) é um personagem. Na crônica, o cronista sequer tem a preocupação de colocar-se na pele de um narrador-personagem ou observador.

• Assunto:O assunto de uma crônica é sempre resultado daquilo que o cronista colhe em suas conversas; das frases que ouve; das pessoas que observa; das situações que registra;

• O Desfecho: No conto há um conflito e, geralmente, um desfecho para ele. Como a finalidade da crônica é analisar as circunstâncias de um fato e não concluí-lo, o desfecho é, praticamente, inexistente.

• A Linguagem: O cronista procura trazer para suas crônicas a oralidade das ruas, isto é, ser oral no escrito. Daí ser predominante nas crônicas a linguagem coloquial e até popular, para introduzir um linguajar de bate-papo (do botequim, da esquina), de conversa-fiada; todos carregados de gírias.

• O Diálogo: É a presença do diálogo na crônica, que faz com que ela se aproxime do conto. Mas, na crônica, o diálogo é forma de interação, que cria uma importante cumplicidade com o leitor, principalmente, através de perguntas lançadas ao ar; ou então, para manter um formato que se aproxime do bate-papo, sua característica marcante:
METODOLOGIA

A metodologia utilizada foi, basicamente, de pesquisas bibliográficas e levantamentos de dados a partir de leituras e reflexões de textos relacionados ao tema proposto. Em tais leituras, sobressaltamos o unânime entendimento de que consagrados escritores da literatura brasileira, de ontem e de hoje (como Machado de Assis e Carlos Heitor Cony), usam do espaço destinado às crônicas como meio eficaz para a conquista dos leitores.

Nenhuma crônica foi transcrita neste estudo, justamente por serem muitas e de tão diferentes estilos, pois o que desejamos é enfatizar os potenciais deste gênero textual , e a percepção de que uma crônica não é um ‘gênero menor’ da Literatura – como também não se resume ao universo literário, pois é híbrida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do espetáculo da vida, a crônica começa ocupar um espaço na literatura. Como gênero literário possui relativa autonomia, advindo da imaginação criadora, visando naturalmente o despertar estético e não o interesse de informar, ensinar ou mesmo orientar o leitor.Assim a crônica adquire uma forma literária autônoma, comunica-se através de uma linguagem dos indivíduos na sociedade. Trata dos pequenos detalhes da sua vida social, fazendo um relato em permanente relação com o tempo, de onde tira, como memória escrita, sua matéria principal, o que fica do vivido. Isto pode ser aplicado ao discurso da história porque sua constante atividade crítica movimenta o exercício da lembrança e da escrita.

Nesse sentido, a crônica pode ser caracterizada como ferramental útil para realizar um estudo histórico de uma sociedade. A ordem e sua coerência não são elementos de distinção, pois seu caráter de ambigüidade faz dela um gênero específico na literatura o qual, não raro, a conduz ao conto, ao ensaio, por vezes, e, freqüentemente, ao poema em prosa. Desse modo, as crônicas não são puro jornalismo ou reportagem. Somente a ligação com a vida cotidiana é que situa a crônica bem próxima do jornalismo, mas diferenciando-se por não ter aquela característica impressionista, de experiência de choque, transmitida como uma mercadoria para o consumo em massa.

O cronista, artista solitário perdido no mundo da informação, busca na crônica o meio de satisfazer seus desejos, suas emoções, seus sonhos irrealizáveis e através dela manifestar seu descontentamento com os projetos de vida compostos no interior de sua sociedade. E, pode se dizer que, é difícil encontrar homens que consigam se comunicar melhor que o cronista. A crônica, esse meio comunicativo, insinuante e ágil é por natureza a arte do cronista.

No entanto, a crônica constitui-se fundamentalmente como um gênero literário, que fala do tempo e da vida humana, que conserva na memória pequenos dias vividos pela sociedade. Situa-se justamente além da notícia, mas no limite da transmissão de experiências vividas pelos homens em sociedade. Em suma, “situa-se bem perto do chão, no cotidiano da cidade moderna, e escolhe a linguagem simples e comunicativa, o tom menor do bate-papo entre amigos, para tratar das pequenas coisas que formam a vida diária, onde às vezes encontra a mais alta poesia”.
BIBLIOGRAFIA

AMORA, Antônio Soares. Introdução a teoria da literatura. São Paulo: Cultrix, 2006

CANDIDO, Antônio. Para gostar de ler. São Paulo: Ática 1982. Prefácio, p. 6.

AMORA, Antônio Soares.Introdução a teoria da literatura .São Paulo: Cultrix, 2006.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São Paulo: Parábola, 2008.

Crônica. Disponível em acesso em 26/10/2010.

ANDRADE, Sérgio Carneiro de. Gêneros textuais crônicas e notícia de jornal. Disponível em < http://www.textolivre.com.br > acesso em: 26/10/2010.

NERY, Alfredina. Gênero entre literatura e jornalismo. Disponível em acesso em: 25/10/2010.

2 comentários:

  1. Gostei,porem, devia ter transcrito alguma crónica e analisar independentemente o tipo só para dar mais ênfase! Obrigada.

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    1. "Nenhuma crônica foi transcrita neste estudo, justamente por serem muitas e de tão diferentes estilos, pois o que desejamos é enfatizar os potenciais deste gênero textual , e a percepção de que uma crônica não é um ‘gênero menor’ da Literatura – como também não se resume ao universo literário, pois é híbrida."

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